Protestos violentos na Argentina em meio à greve geral
A polícia argentina entrou em confronto com manifestantes que protestavam contra as medidas de austeridade do governo, em meio a uma greve de 24 horas por sindicatos que levou o país sul-americano -atingido pela recessão- a um impasse.
A polícia usou na quinta-feira gás lacrimogêneo e canhões de água de alta potência para dispersar os manifestantes na capital, Buenos Aires, onde haviam bloqueado uma estrada principal.
Oficiais da Gendarmeria Nacional argentina haviam se chamado para quebrar o bloqueio, mas as tentativas de remover os manifestantes levaram a violentos confrontos com eles.
Os manifestantes lançaram pedras e empunharam grandes varas para resistir à polícia. Dezenas de prisões foram feitas.
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, enfrenta a primeira greve geral em 16 meses de governo. As duas principais centrais sindicais do país exigem aumentos salariais para acompanhar a inflação, que em 2016 foi de 40%, além de reclamar medidas para compensar a perda de empregos, causadas pela politica de abertura econômica.
O governo argumenta que não pode dar aumentos muito superiores à meta inflacionária deste ano, de 17%, e assegura que as medidas adotadas (entre elas, o reajuste dos preços dos serviços públicos, congelados desde a crise de 2001) atrairão investimentos, tirando o país da recessão. Como não houve acordo, a Confederação Geral do Trabalho (CGT) e a Central de Trabalhadores Argentinos (CTA) decidiram paralisar o transporte público e o país, enquanto as organizações sociais de esquerda se mobilizaram para bloquear as principais vias de acesso aos centros urbanos. Cerca de 800 voos foram cancelados.
Os trens, o metrô e os ônibus não circularão até a meia-noite de ontem. O líder sindical dos motoristas de táxi, Omar Viviani, chegou a ameaçar os que furarem a greve, prometendo “virar os carros”. Ele acabou sendo convocado para depor, perante a Justiça, acusado de atentar contra a liberdade do trabalho.
“Mas o medo já está instalado”, disse um motorista.
Nos primeiros três meses deste ano, Macri enfrentou uma manifestação sindical (em março), uma greve de professores e centenas de protestos isolados, além de piquetes (bloqueios de estradas). Em compensação, milhares de argentinos saíram às ruas no sábado (1º) em apoio ao governo. Aos gritos de “Argentina sem Cristina (Kirchner)” e “sim, se pode”, a multidão autoconvocada pelas redes sociais encheu as praças.
“Na Argentina, a política é feita nas ruas”, disse o economista Marcelo Elizondo. “O que ficou evidente é que o país está dividido: uma parte quer manter a política populista dos 12 anos de governo dos ex-presidentes Nestor e Cristina Kirchner e outra quer as mudanças liberais de Macri”.
Na segunda-feira (3), dois dias apos a marcha a seu favor, Macri prometeu combater as “máfias” no poder. “Não podemos aceitar mais comportamentos mafiosos na Argentina, que estão nos sindicatos, nas empresas, na política e na Justiça”, afirmou. Segundo o governo, a greve custará ao país US$ 1 bilhão.
De acordo com o líder sindical Hugo Yasky, da CTA, a greve será "um plebiscito contundente contra a política de ajuste do governo", que resultou em "demissões, suspensões e queda do poder aquisitivo" dos trabalhadores.
"O governo já gastou 30% de seu mandato e ainda não vimos às mudanças prometidas", acrescentou. .
Eleições
A queda de braço entre o governo e os sindicatos ocorre em ano eleitoral: em outubro, os argentinos irão às urnas para renovar metade da Câmara dos Deputados e um terço do Senado. Macri espera conquistar votos suficientes para converter seus aliados políticos na “primeira minoria” do Legislativo.
O apoio no Congresso, segundo o próprio presidente, é indispensável para dar continuidade às suas políticas. A principal força de oposição a Macri nas eleições será o peronismo - o movimento fundado nos anos 50 pelo ex-presidente Juan Domingo Peron, que hoje está dividido entre “kirchneristas” e “tradicionais”, mas historicamente contou com a aliança dos sindicatos.
Macri ganhou as eleições de dezembro de 2015, prometendo uma Argentina mais transparente e aberta ao mundo. Mesmo sem maioria no Congresso, ele conseguiu reduzir impostos sobre as exportações do setor agroindustrial e da mineração, concluir a renegociação da dívida externa (em moratória desde 2001) e eliminar os controles cambiais (impostos por sua antecessora, Cristina Kirchner, para evitar a fuga de capitais).
Passado um ano, no entanto, ele não conseguiu reduzir de 30% para 25% a inflação herdada, como prometeu. Segundo o analista político Rosendo Fraga, o sucesso de Macri este ano nas urnas vai depender do crescimento econômico e da percepção dos argentinos sobre sua situação.
“Ele prometeu crescimento, mas em 2016 a economia encolheu, a inflação aumentou para 40% e a pobreza afeta um terço dos argentinos”, disse. Além disso, houve perda de postos de trabalho. Nesta quinta-feira, durante a greve, o presidente Mauricio Macri participou em Buenos Aires do Foro Econômico Mundial sobre os desafios da América Latina, onde Macri receberia centenas de potenciais investidores e funcionários estrangeiros.
Um conservador, Macri havia prometido reduzir os gastos e os preços no consumidor depois de 12 anos de governo esquerdista antes dele. Embora as políticas de Macri tenham levado a protestos maciços no país, ele diz que as medidas são necessárias para reavivar a fraca economia da Argentina, atrair investimentos e acabar com os supostos fracassos econômicos de sua antecessora, Cristina Fernández de Kirchner.
"A situação é dramática", disse Julio Piumato, porta-voz do grupo de trabalho CGT, que se encontra no aeroporto Jorge Newbery durante uma greve geral de 24 horas, na Argentina, em 6 de abril de 2017. "A riqueza está sendo concentrada nas mãos de alguns na mesma proporção que a pobreza está crescendo."
"São necessárias medidas urgentes para criar emprego. Um em cada três argentinos é pobre ", acrescentou.